Senti falta da sua ausência

Sobre lembrar de tempos muito piores, mas que havia pelo menos o sentido de pertencer. É claro que, com ele, vinha a descrença completa e uma desmotivação generalizada sobre a humanidade. Mas havia pertencimento. E o pertencimento bastava. E a nossa poesia sempre repousou nisso, no fim: na sensação de bastar. 

A mão da saudade é sádica: solta logo antes de sufocar - e por isso a gente fica sempre na pontinha dos pés, ofegante, romantizando a vinda da morte como quem anseia por migalhas de afeto.


Conforme o tempo passa, no entanto, uma das minhas maiores sortes é que eu sempre a encontro de volta: a sensação esmagadora, gulosa, de ser insuficiente. Afinal, existe um inegável conforto na familiaridade.  


(Dessa vez, eu realmente acreditei que você tinha me abandonado de forma definitiva, viu? Foi embora tão sorrateira, sem deixar cartões de despedidas, que quando acordei ao meio dia de domingo me vi estranhamente completa.)


Mas ela voltou. Ele sempre volta. Duas pontadinhas firmes na boca do estômago, paradoxalmente imperecíveis e fugazes, mas daquele jeito que só os nossos próprios pensamentos inquietantes conseguem nos amordaçar.  Quase não a reconheci, mas, agora que ressurgiu tão intensamente, eu acho que me lembro bem. É impossível esquecer do que te já te consumiu tantas outras vezes.


E eu volto a me sentir encharcada de vazio. A ausência do pertencimento me inunda e afaga. Engolir saliva não serve mais para mitigar nada. Sou espectadora da vida, completamente alheia aos meus próprios trejeitos, presa num ciclo cuja única pessoa capaz de colocar fim sou eu - e o maior medo é esse mesmo. 




(Quer um café e uma coberta?)

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