FANTASMAS


Sinto-me ameaçada. Contudo, quando a noite vem, são eles os meus únicos amigos. Sim, os fantasmas, companheiros noturnos que me envolvem com seus braços esmagadores e implacáveis.
Durante o dia, os sorrisos falsos me preenchem. Distanciam-se os fantasmas, deixando-me livre para acatar a mediocridade cotidiana. De olhos abertos, transformo-me em apenas mais uma vítima da simpatia vazia, receptora do carisma forçado. Internamente, clamo por afeição genuína, ainda que interprete meu papel muito bem.
Mas não à noite. Ah, não, de madrugada, os fantasmas visitam. Diariamente, basta que o sol se ponha para que a escuridão invada meu corpo, comprimindo-o com seu veneno corrosivo. Encaro o teto. Quando a noite anuncia sua chegada, ele reflete as sombras de um passado agradável. É tumulto, desespero, som. Mata-me e salva-me da morte ao mesmo tempo.
Espero com apreensão e ansiedade pela vinda da lua, só para que os fantasmas mostrem-me seus rostos novamente, zombeteiros e despreocupados. E eles não me decepcionam - aparecem, abraçando-me com seu calor inexistente. Confortam-me, afogam-me em lembranças adocicadas, abrem meu peito necessitado de presença.
Logo após, sem se preocupar com meus sentimentos, eles me abandonam. Partem sem floreios ou avisos. Não se despedem, não esperam meus pedidos desesperados para que não demorem a retornar.
Meu apego pelos fantasmas cresce ciclicamente, assim como o medo que nutro por eles. Meio inconsciente, calejada pelo desgaste extraordinário que perturba meu sono, tento conviver com eles. Distante, sim, mas irritada por ter que libertá-los. A dor de tê-los não valeria nada se comparada com a de perdê-los.

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